A reader lives a thousand lives before he dies, said Jojen. The man who never reads lives only one. (George R. R. Martin)

terça-feira, 21 de abril de 2015

A Chama ao Vento


– E o homem, esse João Lopes, deu-te uma mala com coisas secretas da tua avó? Interessante.
Sorri, apesar de tudo. A Teresa estava curiosa. Por momentos, senti-me tentado a voltar a meter tudo na maleta e ir refugiar-me nela, como ela queria. Imaginei-me no seu sofá cinzento, as fotos destacando-se na madeira escura da sua mesa de café, e o seu corpo, morno e reconfortante, enroscado ao meu lado. Imaginei a estranheza de partilhar a leitura das cartas que me intrigavam, de tentar decifrar algum dos gatafunhos junto aos poemas misteriosos. Cheguei a levantar-me outra vez, a chave apertada nos dedos, mas deixei-me cair novamente sobre o sofá.
– É interessante – concordei. – Há um livro de poemas numa língua qualquer, parece-me hebraico, mas não sei, e meia dúzia de cartas por enviar, para alguém que se chama Dekel… nem sei se é homem ou mulher, não as li. Dei uma vista de olhos esta tarde, mas depois… Ainda só vi realmente as fotografias.
– São da tua avó?
– Sim. Há umas com as amigas e com o João Lopes, quando eram novos. E há uma com um tipo… até pode ser o tal Dekel – hesitei. – Não a reconheço. Quer dizer, é ela, mais nova, claro, mas ao mesmo tempo não é. A avó tratava-me bem, cuidava de mim, eu sei que gostava de mim, mas como pessoa era… – Faltou-me a palavra e ela tentou ajudar-me:
– Vazia? Morta por dentro, sem chama?
– Sim. Como se se tivesse tornado uma espécie de não-pessoa. Um buraco onde devia haver alguém. Nunca lhe ouvi uma gargalhada, nunca a vi chorar nem zangar-se, nem comigo, nem com o avô, nada. Acreditas? Podia partir um prato antigo, ou os dentes a um colega, ou tirar a melhor nota da turma, que era como se nada lhe importasse, nem eu, nem ela própria… Até o seu olhar estava sempre noutro lado, longe. Sei lá. A rapariga das fotos transpira vida. O sorriso, os olhos… estão vivos.
– E o que dá cabo de ti é não saberes porquê.

Há uns meses participei num passatempo e saiu-me este livro :) (nunca me sai nada) Andou perdido pela minha biblioteca de ebooks durante algum tempo, e agora resolvi pegar-lhe...

Comecei a ler sem qualquer tipo de expectativa. Logo nas primeiras páginas começaram as surpresas! Um corpo atirado ao mar? Um salto no tempo, e um casal de férias no Algarve que terminam em discussão e vai cada um para seu lado... Confesso! Fiquei presa logo nas primeiras páginas! Nem foi preciso o mínimo esforço! Por isso, parabéns Carla M. Soares!

À medida que ia avançando na leitura, conhecendo personagens e entrando dento da narrativa, ia ficando cada vez mais intrigada e curiosa. Intrigada em relação ao rumo que tudo estava a tomar... Curiosa pelo desfecho que poderia ter...

A escrita da Carla é bastante simples e contagiante. Daquele tipo que nos prende e não nos larga até chegarmos à última página e, quando esse momento chega e tudo é revelado, deixa-nos um sabor agridoce. Por um lado, as dúvidas estão desfeitas, mas também a leitura chegou ao fim... 

Admito que não costumo acompanhar de perto o trabalho dos autores portugueses. Contudo, todos os que tenho descoberto ultimamente (a grande maioria não tem a visibilidade que deveria) têm sido surpresas muito agradáveis e que me deixaram com muita vontade de continuar a acompanhar e (re)descobrir o seu trabalho. A Carla não foi excepção! Certamente não ficarei por aqui com os seus livros! Est'A Chama ao Vento foi apenas o ponto de partida para a descoberta.

Aconselho!
Ideal para os apaixonados pelos mistérios da II Guerra Mundial e dos países neutros... Afinal, em Portugal também havia espiões estrangeiros...

quinta-feira, 9 de abril de 2015

24h Non Stop Reading



Estava muito bem a vaguear pelo Facebook na segunda-feira depois de jantar, a ver se havia alguma novidade (literária ou não) interessante quando vi um post da Mary (do blog e canal Mary Red Hair)... Ela estava a preparar-se para um desafio 24h Non Stop Reading durante o dia 7 de Abril (dia seguinte) e perguntava se ninguém a queria acompanhar.

Olhei para o meu livro de cabeceira. Estava a gostar muito do que estava a ler, mas já o andava a arrastar há demasiado tempo por, precisamente, falta de tempo... Resolvi que era um bom dia para arriscar e entrar num novo desafio. Juntei-me a ela.


O único objectivo que tinha, durante 24h de leitura (que não poderiam ser totalmente dedicadas a ler, pois já tinha outras coisas planeadas), era terminar o livro que tinha em mãos. Estava na página 448 (a meio de um capítulo) de O Grande Amor da Minha Vida, de Paullina Simons, e faltavam cerca de 250 páginas para o fim.

Comecei a ler às 00:00 de terça-feira, dia 7 de Abril, e cerca de 22 horas depois (a 2h de terminar o desafio) tinha terminado o livro :)
Reconheço que não pensei que fosse possível chegar ao fim, mas foi um resultado muito positivo e gostei particularmente da experiência. 

Obrigada Mary pela companhia ;)
Um dia destes vou repetir a proeza!

E vocês? Já fizeram "loucuras" destas? Como foi a experiência?

quarta-feira, 8 de abril de 2015

O Grande Amor da Minha Vida - O Cavaleiro de Bronze (Trilogia: Tatiana & Alexander Volume I)


Em criança, num verão passado em Luga, o seu querido Deda dissera-lhe ao vê-la deprimida e desnorteada:
- Responde a três perguntas,Tatiana Metanova, e saberás quem és. São elas: Em que acreditas? Em que confias? Mas mais importante: Que amas?
Levantou o rosto para Alexander:
- Como era Shura? Na primeira noite, disseste que eu e tu tínhamos alguma coisa, a que chamaste...
- A força do amor.
«Sei quem sou», pensou, dando-lhe a mão e virando-se para o altar. «Sou a Tatiana. E acredito, confio e amo o Alexander para toda a vida.»
(…)
- Então? Ainda achas que devia ter sido o conservador do registo civil a casar-nos? - Sorrindo de orelha a orelha: - Ele mais a sua filosofia das «faculdades mentais»?
Tatiana abanou a cabeça:
- Tinhas toda a razão. Foi perfeito. Como sabias?
- Porque foi Deus que nos uniu. Esta foi a nossa maneira de Lhe agradecermos.

Chego ao final deste livro e tenho uma certeza absoluta: adiei a sua leitura durante demasiado tempo! Toda a polémica em redor da publicação desta trilogia em Portugal fez-me pensar se queria ou não partir para a sua leitura, visto que não teria, à partida, o desfecho da história. É que só por ser um Romance Histórico era meio caminho andado para me deixar completamente colada às suas páginas...

Romance Histórico. II Guerra Mundial. Rússia. 
É um facto que adoro este género literário e o período que envolve a II Guerra Mundial, com todo o seu horror envolvente desperta-me bastante a curiosidade. A cereja no topo do bolo, neste caso, foi o facto de não ter muito conhecimento a respeito da vida russa neste período. Ok, o Comunismo marcava o país, as pessoas eram demasiado pobres e foram bastante privadas de tudo durante a Guerra, mas isso são dados adquiridos. Faltava-me uma certa realidade.

Tatiana e Alexander conhecem-se, numa paragem de autocarro de Leninegrado, no fatídico dia em que a Rússia entra na Guerra (22 de Junho de 1941) e, por ironia do destino (ou não), as suas vidas nunca mais serão as mesmas. 

Guerra, sofrimento, fome, morte, amor e esperança... 
São mais de seiscentas páginas em que tudo isto está presente de forma mais ou menos intensa e que nos transportam até estes anos de sofrimento mas em que é notório que as pessoas precisavam de ter algo a que se agarrar para continuar a viver. Era preciso acreditar, numa terra de comunistas onde se rejeitava por completo a presença de uma entidade superior, que a vida tinha de continuar e que era possível ultrapassar os dias negros...

Aos poucos fui-me apaixonando pela inocente Tatiana e pelo determinado Alexander. São personagens fictícias, mas que me fizeram pensar se não haverá perdidos na História algumas Tatianas e Alexanders que lutaram contra tudo e contra todos, até mesmo a própria morte, para poderem viver o seu amor...

Quero muito terminar a trilogia e conhecer o desfecho da vida deste casal! 

Recomendo! Aos amantes do Romance Histórico, sem dúvida, e a todos os outros que queiram conhecer uma estória de amor e esperança muito bem contada.

Orgulho e Preconceito


Após alguns minutos de silêncio, Darcy aproximou-se dela e, extremamente agitado, disse:
- Em vão lutei. De nada serviu. É impossível sufocar o que sinto. Tem de me consentir que lhe diga como a admiro e amo ardentemente.
O espanto de Elizabeth foi além de toda a expressão. Arregalou os olhos, corou, não quis acreditar e ficou calada. 
Darcy considerou esse silêncio como um suficiente encorajamento e, assim, logo confessou tudo o que havia muito por ela sentia. Exprimia-se corretamente, mas tinha sentimentos a expor além dos que o coração lhe inspirava, e ele não era mais eloquente a falar de ternura do que a respeito de orgulho. (...)
Apesar da sua antipatia profundamente enraizada, Elizabeth não podia ficar insensível à homenagem que o afecto de tal homem reprensentava e, embora nem por um instante sequer as suas intenções se modificassem, ficou de início com pena do desgosto que lhe ia infligir. (…)
- Em casos como este, suponho que é regra estabelecida exprimir os sentimentos de gratidão pela honra que nos é conferida, mesmo que eles sejam correspondidos de maneira diferente. É natural que se sinta gratidão por tal e, se estivesse na minhas posses sentir-me grata, agradecer-lho-ia agora. Mas não posso. Nunca aspirei a merecer-lhe uma boa opinião e o senhor decerto concedeu a sua muito contra vontade. Lamento contristar seja quem for. (...)

Orgulho e Preconceito. O Clássico. Tens de ler!
Será mesmo assim? Para mim não! Lamento se estou a desiludir os amantes de Austen e os fieis seguidores de Darcy e Elizabeth, mas esta é a minha opinião.

Não vou dizer que odiei o livro porque não seria de todo verdade. Mas também não fiquei completamente rendida à narrativa e à escrita. É certo que os Clássicos não são as minhas leituras de eleição, mas também não são livros que coloque completamente de parte. O facto é que a escrita por vezes torna-se monótona e as descrições características deste tipo de livros é sempre algo que me deixa de pé atrás. Isto faz com que seja um livro de leitura lenta e, em cartas partes, um pouco arrastada. Confesso que no início do livro, por algumas vezes, estive tentada a pô-lo de parte, mas obriguei-me a continuar e a leitura foi ficando mais agradável à medida que ia avançando. Mas não tanto que me fizesse suspirar por mais, infelizmente. 

Gosto, no entanto, das críticas sociais implícitas neste tipo de livros e de conhecer as sociedades de época dos diferentes países, de acordo com os autores. Também o facto de este livro ter sido escrito por uma mulher em pleno século XVIII me despertava alguma curiosidade. 
É um facto que, no século XVIII, um dos principais objectivos de uma mãe era que as filhas tivessem um bom casamento. Numa casa onde existiam cinco filhas e nenhum filho, essa necessidade estava multiplicada por cinco... O que é certo é que Austen pretende desviar um bocadinho esta "obsessão" do ponto central da narrativa, explorando um lado mais liberal e romântico na mulher, tornando-a, também, mais independente. De facto, esta característica é que vai fazer despertar o amor de Darcy por Elizabeth.
Ok, até simpatizei com Bingley e Darcy, apesar dos mal-entendidos entre os dois. Jane e Elizabeth também me conseguiram arrancar sorrisos em diversas partes, muito mais que as irmãs, mas nada mais.

Por agora, deixo de parte os Clássicos de Austen, mas, quem sabe um dia, lhe volte a dedicar algum tempo e aí consiga ficar rendida a esta mulher um tanto ou quanto avançada para a época em que viveu.

O Prisioneiro do Céu


Segundo a minha experiência pessoal, quando alguém descobria aquele local, a sua reacção era de encantamento e assombro. A beleza e o mistério do recinto reduziam o visitante ao silêncio, à contemplação, ao sonho. Como é óbvio, a reacção de Fermín teve de ser diferente. Passou a primeira meia hora hipnotizado, deambulando como um possesso pelas passagens do enorme quebra-cabeças que era o labirinto. Parava para bater com os nós dos dedos em arcobotantes e colunas, como se duvidasse da sua solidez. Detinha-se em ângulos e perspectivas, fazendo um telescópio com as mãos e tentando decifrar a lógica da estrutura. Percorria a espiral de bibliotecas com o seu considerável nariz a um centímetro da infinidade de lombadas alinhadas em suas sem fim, escrutinando títulos e catalogando tudo quanto descobria. Seguia-o a poucos passos, entre o alarme e a preocupação.
Começava a suspeitar que Isaac nos expulsaria a pontapés, quando, numa das pontes suspensas entre as abóbadas de livros, choquei com ele. Para minha surpresa, não só não se lia no seu rosto qualquer sinal de irritação como sorria bem-disposto, ao contemplar os progressos que Fermín ia fazendo na sua primeira exploração do Cemitério dos Livros Esquecidos.
O seu amigo é um espécimen bastante peculiar - observou Isaac.

Não sabe o senhor a que ponto.

Barcelona, 1957.
Voltamos à "actualidade", ou seja, voltamos a encontrar Daniel Sempere e Fermín Romero de Torres na livraria Sempere e Hijos que conhecemos em A Sombra do Vento. 
Tudo o que senti falta em O Jogo do Anjo está de volta, tanto os personagens principais como o humor fantástico de Fermín. Mas agora temos uma perspectiva diferente da vida de Daniel, visto termos conhecido o passado dos seus pais.

O livro anterior, dando um salto no tempo, permite fazer a ponte entre o passado e o presente, a respeito da existência de Daniel. Mas e Fermín? O misterioso personagem que "caiu do céu" em A Sombra do Vento, que se tornou amicíssimo tanto do senhor Sempere como do seu filho Daniel, que descobriu o amor nos braços da Bernarda... Quem é este homem afinal? Será que foi assim tão ao acaso que tropeçou na vida de Daniel e foi trabalhar para a livraria? Que segredos afinal esconde Fermín? 

Em O Prisioneiro do Céu conhecemos a história de vida de Fermín, e podemos fazer a ponte entre este livro e o Jogo do Anjo.

Apesar de ter sido, dos três o que menos gostei, adorei conhecer a difícil vida de Fermín e é pena que esta fantástica saga não tenha ainda o seu desfecho. Ficam muitas questões em aberto e, talvez tenha sido esse o facto que mais contribuiu para a classificação mais fraca que dei a este livro.
Ainda assim, continuo rendida à escrita e ao estilo de Zafón e recomendo este livro tal como os anteriores.